Nossa conversa agora terá uma clínica como foco e referência para nossas contas e reflexões. Convido você a provocar seu pensamento estratégico dentro deste segmento de gestão de custos em odontologia. Como em diversos outros setores de serviços, o consultório, é também uma empresa que passa constantemente por processos de mudanças que ocorrem por exigências econômicas, políticas, mercadológicas e organizacionais. A gestão de custos é uma estratégia importante de se obter melhor desempenho, vantagem competitiva e importantes tomadas de decisões.
A atividade liberal, mesmo na condição de pessoa física, como dentista e proprietário de consultório, tem que ser entendida como uma atividade empresarial. Para isso, é importante que os dentistas tenham noções de ferramentas aplicadas no mundo corporativo que possam ajudá-los a embasar melhor a sua tomada de decisão. Não posso deixar de registrar o termo Odontologia Extrabucal que de forma ampla representa este pensamento de gestão e empresarial. A necessidade de utilização de conhecimentos gerenciais nessa área impactou fortemente na vida desses profissionais que não recebem treinamento nessa área nos cursos de graduação.
Empresas de todos os portes necessitam de controles e análises de custos para que possam ter subsídios para avaliação de desempenho, bem como tomada de novas decisões. Como não é possível de forma individual manipular os preços de mercado, então é primordial realizar um eficiente controle em seus processos por meio de uma correta gestão de custos.
O tema fala de quantidade e desempenho de dinheiro na gestão de custos e aqui fica registrada a abordagem do dinheiro em relação ao cenário de um consultório. Um dinheiro faturado de forma ética, profissional, comprometida, mas na gestão de custos foi dividida em dois segmentos de reflexão: a quantidade de dinheiro e o desempenho do dinheiro.
Vamos ao caso de um profissional, o dono que tem uma clínica com 05 cadeiras odontológicas. Uma clínica com base em ortodontia e clínica geral. O serviço era prestado pelo dono responsável também pela Gestão e que atua como Executor e absorve principalmente a clientela privada e de ticket médio melhor. Nas outras cadeiras a ocupação é de profissionais contratados por tempo dedicado (carga horária) ou serviços concluídos (percentual de produção) para atenderem o restante da demanda privada e planos odontológicos. Seu negócio apresenta em faturamento médio mensal de R$ 40.000,00. Os números usados neste caso estão arredondados e definidos por estimativa para facilitar o processo de entendimento e aprendizado. No faturamento médio mensal a série histórica de um ano pode mostrar uma curva de observação importante. Meses ciclicamente de melhor e pior faturamento avisam a necessidade maior ou menor de capital de giro. Em muitos consultórios uma série de três ou quatro meses já pode ser usada. R$ 40.000,00 pode ser uma quantidade grande de dinheiro. Isso depende se seu perfil de vida financeira pessoal e profissional e do desempenho deste dinheiro. Um desafio é saber ajustar o que se ganha ao que se gasta incluindo um planejamento de independência financeira.
Mas, o fato era um faturamento de R$ 40.000,00. Agora vamos fazer uma avaliação básica do desempenho do dinheiro. Este faturamento médio foi dividido em dois segmentos básicos: O que o dono produzia como executor e o que os outros profissionais produziam. Lembre-se da diferença de perfil de público alvo. O mesmo foi feito por estimativa para os custos de cada segmento. Custos prediais e RH foram alocados por atividades como no método de custeio ABC e outros custos no método de custeio variável. Um modelo de gestão de custos foi ajustado ao perfil da clínica e uma tabela simplificada em seguida apresentará números importantes:
CLÍNICA | DONO | OUTROS PROFISSIONAIS | |
FATURAMENTO (R$) | 40.000,00 | 15.000,00 | 25.000,00 |
CUSTOS TOTAIS (R$) | 38.000,00 | 7.000,00 | 28.000,00 |
RESULTADO (R$) | 2.000,00 | 8.000,00 | (3.000,00) |
TOTAL de HORAS | 725 | 100 | 625 |
TICKET MÉDIO (R$)(FATURAMENTO / HORAS) (R$) | 55,00 | 150,00 | 40,00 |
O dono da clínica tem como queixa principal não entender qual é o caminho dos R$ 40.000,00 em sua empresa. Aqui consideramos um mês para o pensamento estratégico nos números, mas uma série histórica de custos e receitas maior nos permite mais precisão nas conclusões. A descoberta principal foi sobre um faturamento com serviços terceirizados ser de R$ 25.000,00 e ter um custo de R$ 28.000,00. Foi calculado também o ticket médio de R$ 40,00 por hora. Lembrando que neste caso o ticket médio representa a média recebida por hora num determinado segmento de atendimento. Mas, como isso é possível? Possíveis causas: ticket médio baixo, preço praticado próximo ao custo, reduzida margem de contribuição, sistema de remuneração por hora e/ou percentual de produção pago ao dentista, glosas e inadimplências, impostos, materiais de maior custo para serviços, tempo de execução dos procedimentos acima da média, custos com retrabalho, custos com ociosidade de agenda, recursos humanos disponibilizados, etc. Ou seja, a soma dos custos sejam eles explícitos ou implícitos para fazer a entrega do serviço é maior do que o faturamento por execução. Mais interessante é refletir que uma quantidade maior de faturamento tem uma grande probabilidade de piorar o desempenho da empresa. Também como indicador importante o ticket médio de R$ 40,00 por hora realizada. Cabe a comparação com os outros tickets médios da clínica.
Outra descoberta foi que parte do faturamento do dono é usado para cobrir o segmento de serviço terceirizado, ou seja, que seu desempenho está sendo prejudicado pelo serviço terceirizado. E quanto mais o serviço terceirizado aumentar o faturamento, provavelmente o desempenho como gestor e executor piorará. Sua percepção que sua clínica precisava de um modelo de gestão de custos começou quando sua retirada mensal (e aleatória!) para cobrir suas finanças pessoais foi diminuindo. Como em muitos casos semelhantes em outros consultórios e clínicas, este dono não tem definido um custo fixo como gestor (prolabore/salário/retirada) referente a seu trabalho como um custo que deve ser incluído no cálculo de sua formação de preço e definição de processos compartilhados com outros dentistas. Sua rotina é pegar uma parte do faturado para sua vida pessoal baseado em fluxo de caixa diário. Um gestor sabe que não é simples como retirar o que sobra no dia e levar para casa. Um formato de precificação deve incluir o custo de seu planejamento financeiro pessoal para poderem ser definidas metas de vendas na empresa. Um modelo de gestão de custos de um consultório ou uma clínica deve ter um custo fixo referente ao quanto o Dono pretende definir como receita mensal por ser o gestor da clínica. Este custo fixo em muitos negócios é o principal componente e na grande maioria o que recebe primeiros cortes quando os negócios não vão bem. Um planejamento de finanças pessoais é pilar de uma boa gestão de custos em odontologia e demais negócios.
Os indicadores de ticket médio sinalizam uma grande diferença. O dono tinha um ticket médio de R$ 150,00 e outros dentistas R$ 40,00. Esta discrepância comprovava a dependência de sua atuação como dentista executor para a saúde financeira da clínica. Seu tempo de trabalho com presença física na execução do serviço e seu desempenho financeiro comprovado pelo ticket médio são fundamentais para o faturamento do negócio. A sinalização destes indicadores simplificados de resultados e ticket médio foi importante para mostrar ao dono da clínica a necessidade de reorganização do modelo de negócio e de gestão de custos em sua clínica.
O caso desta clínica tem características comuns a muitas outras clínicas odontológicas. Muitos negócios em odontologia e certamente também fora deste setor de serviços tem a quantidade de dinheiro faturado como foco principal na condução financeira de seus empreendimentos. Não consideram o desempenho deste dinheiro ao ser trocado por hora, um serviço ou um plano de tratamento. A gestão de custos deve ser disseminada na comunidade acadêmica, cirurgiões dentistas e gestores de empresas prestadoras de serviços em odontologia. O pensamento estratégico em odontologia aliado a uma correta gestão de custos são cada vez mais importantes na condução de uma carreira com percurso mais orientado e menos turbulento.
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Flávio Ribeiro
Coach e Consultor PenseFar Coaching Financeiro; Master Coach e Analista Comportamental pelo Instituto Brasileiro de Coaching com certificação pela European Coaching Association – ECA e Global Coaching Community – GCC; MBA Executivo Gerência de Saúde pela ISAE FGV; MBA Gestão de Serviços de Saúde pela UFF–RJ; Graduado em Odontologia; Mestre em Gestão e Economia da Saúde na UFPE.
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