Certa vez, num país muito distante, conversando com uma Dentista, perguntei-a onde estavam guardadas suas últimas cinco declarações de imposto de renda. Sua resposta imediata, e como respondem a maioria dos dentistas, foi de que estavam guardadas com o seu contador. A dentista não tinha em seus arquivos nenhuma das declarações, muito menos recibos de entrega à Receita Federal. Como atuo no segmento de gestão financeira, solicitei as últimas cinco declarações de IRPF (Imposto de Renda Pessoa Física) para uma análise mais aprofundada. Até porque tratava-se de uma profissional que tinha um faturamento médio anual de R$300.000,00, ou seja, de forma simples e estimada, as últimas cinco declarações deveriam apresentar um faturamento de R$ 1.5000.000,00. E aí já vai uma poderosa dica da PenseFar que insiste em fazer o Dentista usar o pensamento estratégico na gestão de seu negócio e de sua carreira: procure entender o mínimo de imposto de renda e enxergue o planejamento tributário como uma forma de ganhar, ou deixar de perder dinheiro, fora do cubo intrabucal. Em odontologia não se ganha dinheiro só quando está de luvas. Isso é paradigma do passado! Planejar, diagnosticar um modelo de negócio são fundamentais nos dias de hoje para uma trajetória mais assertiva. Mas voltando à dentista de R$1.500.000,00 de faturamento nos últimos cinco anos, e que delegava sua vida tributária ao seu contador, ao receber as declarações solicitadas, para surpresa minha e desespero da profissional, o envelope com as declarações contemplavam apenas as três últimas e com um lançamento anual de menos de R$ 25.000,00 em cada uma, sem livro-caixa e nem precisa falar mais nada. Aí fica a pergunta: de quem é a responsabilidade por fato como este? De quem as fez ou de quem confiou e não se preocupou em ter nas mão o procedimento fiscal finalizado? Muitos dentistas respondem não ter tempo para isso. A culpa eu não sei dizer, mas o CPF que irá assumir este erro nós sabemos de quem é.
Portanto resolvi pontuar algumas dicas e erros clássicos que dentistas cometem em sua gestão financeira de sua vida pessoal e de seu consultório/empresa.
– Controle com precisão as entradas e saídas financeiras de sua vida pessoal e consultório. Uso uma frase que resume esta primeira dica: O dentista tem que saber quanto entra, quanto sai, de onde vem e para onde vai o dinheiro em sua vida e no seu negócio.
– Não misture conta pessoal com conta da empresa. Nem que para isso você tenha duas contas bancárias separadas e, assim como paga sua secretária uma vez por mês, você faz uma única retirada do seu salário/pró-labore e bota na sua conta pessoal. Este erro é cometido pela maioria dos Dentistas que passam pela PenseFar. A definição de um pró-labore, pilar de uma precificação, passa por uma pergunta que poucos Dentistas sabem responder: Quanto você precisa ganhar por ano para bancar seu planejamento de vida pessoal?
– Nos pagamentos em cheque, cartão de débito, cartão de crédito, transferências bancárias a emissão de recibos (CPF) ou notas fiscais (CNPJ) é obrigatória e deve ser sempre tributada. Para quem não sabe o Banco Central usa um supercomputador chamado Hall que monitora on-line todas as contas bancárias e suas transações divididas por CPF e CNPJ usando inteligência artificial como base do software. Para se ter uma noção deste monitoramento, em quatro dias de processamento, o Hall criou 150 milhões de pastas diferentes, uma para cada correntista do Brasil, com respectivos CPFs e CNPJs, e as respectivas operações realizadas em cada conta. Este rastreamento eletrônico dispensa fiscais. Não tem como contestar um relatório de controle do Hall.
– Num passado remoto, o Dentista tinha como opção trabalhar sem emitir recibos/notas fiscais para seus clientes para reduzir impactos tributários. O chamado caixa 2. Isso em muitos casos acarretava um grande erro em sua declaração anual de rendimentos: alteração patrimonial incompatível com sua renda declarada. Um exemplo: como é possível comprar um automóvel de R$ 100.000,00 se foi declarado apenas R$ 80.000,00 como rendimentos anuais do profissional e de seu consultório? Todo Dentista deve ter controle de seus gastos no ano e confrontá-los com seus rendimentos e outras fontes de renda para saber se são suficientes para bancarem todos os pagamentos realizados.
– Entenda que um dos componentes de uma precificação estratégica é o imposto. Este componente calculado em forma de percentual deve constar em sua precificação. Deve ser reservado no momento de se acertar as contas com o fisco e existir como uma reserva na conta bancária da empresa. De forma estimada a sugestão da PenseFar é reservar em torno de 15% do faturamento para impostos. Mas é fundamental que você saiba definir este percentual conforme seu modelo de negócio.
– Na opção de recebimentos por meio de cartão com vendas parceladas, descubra qual a taxa em percentual que uma venda parcelada impacta em seu preço. A venda parcelada é uma das estratégias para ampliar o número de vendas no consultório, tem um custo e deve ser incluído na precificação. Exemplo: Se um Dentista cobra R$ 10.000,00 por um serviço e ao parcelar em seis vezes recebe R$9.000,00, o custo deste parcelamento é de R$ 1.000,00, ou seja 10% do seu preço. Em muitos casos estes 10% afetam predatoriamente a margem de contribuição e se não for feita um ajuste no processo de precificação a empresa poderá sofrer financeiramente com isso. Na prática o impacto é ter que trabalhar mais horas no mocho para um mesmo objetivo financeiro já que o ponto de equilíbrio da empresa foi alterado para mais horas ou quantidade de serviços.
– Ao fazer parcerias em seu consultório por meio de rateio percentual (50/50, 60/40, 30,70, 22/78, etc), retire no momento deste rateio os custos variáveis de imposto, taxa de cartão e materiais “mais caros” como próteses, implantes, enxertos, limas de técnica rotatória, brackets, etc. Estes custos entram e saem de seu consultório pois não te pertencem. Não retirar estes custos variáveis da conta reduz em muito sua margem de contribuição para bancar os custos fixos de seu consultório. Em tempo, numa visão atual de modelos de parcerias o pagamento de valores fixos por procedimentos pode ser uma opção melhor que o rateio por percentual.
Na odontologia atual, vista como negócio, não existe mais espaço para amadorismo em sua gestão. Procurem revisar seus processos de gestão de custos, seus controles financeiros, dediquem uma parte do seu tempo à Odontologia Extrabucal. Entenda que trabalhar sem luvas e com algumas planilhas nas mãos é, cada vez mais, o grande diferencial em um planejamento de carreira que deve proporcionar, com uma bússola nas mãos, sua independência financeira. Pergunta tradicional de um coach financeiro: Isso faz sentido para você?
Flávio Ribeiro
Cirurgião-dentista pela Faculdade de Odontologia de Nova Friburgo. Mestre em Gestão e Economia na Saúde na Universidade Federal de Pernambuco. MBA em Gestão de Serviços de Saúde pela Universidade Federal Fluminense. MBA Executivo Gerência de Saúde pela FGV.
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